UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE LETRAS GIOVANNA ZAVAN KUROSU Emma: a condição feminina em pauta São Paulo 2023 Emma: a condição feminina em pauta Projeto de pesquisa para elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial à obtenção do grau de licenciatura em Letras. ORIENTADORA: Profa. Dra. Alleid Ribeiro Machado SÃO PAULO – SP 2023 GIOVANNA ZAVAN KUROSU EMMA: A CONDIÇÃO FEMININA EM PAUTA Projeto de pesquisa para elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial à obtenção do grau de licenciatura em Letras. Aprovada em BANCA EXAMINADORA ______________________________________________________ Profª. Drª. Lilian Cristina Correa Universidade Presbiteriana Mackenzie ______________________________________________________ Profª. Drª. Maria Elisa Rodrigues Moreira Universidade Presbiteriana Mackenzie ______________________________________________________ Profª. Drª. Alleid Ribeiro Machado Universidade Presbiteriana Mackenzie AGRADECIMENTOS Alguns parágrafos não são suficientes para mencionar todos que me trouxeram até esse ponto. Em primeiro lugar, gostaria de agradecer minha orientadora, Alleid Ribeiro Machado, que esteve presente em todos os momentos do trabalho. Obrigada por ler minhas primeiras versões, algumas páginas sem futuro, mas com muito carinho e suor. Mil vezes obrigada por abrir caminho para esse trabalho. Não posso deixar de agradecer a base de tudo, minha mãe, Heline. Obrigada por ter sido tudo que eu sempre precisei. Que orgulho que eu tenho de ser uma parte tão pequena da sua imensidão. Nada seria possível sem sua fé inabalável em mim, mesmo quando eu mesma não acreditava. Eu te amo, melhor amiga. Gostaria de agradecer também meu pai, Ricardo, cuja paciência de aguentar nossas discussões foi imensa. Obrigada por superar sua criação, que não foi repleta de carinho, e me dar os abraços mais apertados sempre que eu precisei. Impossível não lembrar das minhas duas metades, minhas irmãs, Olivia e Luciana. Olivia, minha irmãzinha, você vai sempre ser um bebê nos meus olhos. Luciana, minha tata, você será pra sempre minha inspiração. Amo vocês, crianças. À minha tia Helga. Seu amor e sua confiança nunca falharam comigo, nem com ninguém ao seu redor. Você carrega uma aura de amor onde quer que vá, que sorte a minha de ser sua sobrinha e de poder amar você de perto. Por último, não posso deixar de agradecer às minhas parceiras de curso, Geovana e Valentina. Minhas pintinas, que prazer ter compartilhado todas as angústias, frustrações, mas também felicidades e amores com vocês. Gigi, obrigada por ser minha companheira de todas as horas, me acompanhar em passeios de senhora e sempre me apoiar em tudo, inclusive nas frustrações com esse trabalho. Nina, obrigada por ter dividido um guarda-chuva comigo no primeiro dia e me mostrado desde sempre que eu não estou sozinha. Espero ter sido metade do que vocês foram para mim e espero que possamos sempre continuar assim, juntas. À Universidade Presbiteriana Mackenzie, obrigada pelos 4 anos mais inesquecíveis que eu já tive. Obrigada. “Qualquer pessoa, seja homem ou mulher, que não souber apreciar um bom romance deve ser insuportavelmente estúpido.” (Jane Austen) RESUMO O presente trabalho busca investigar as mudanças entre a personagem Emma do romance homônimo de Jane Austen e a adaptação de mesmo nome lançada nas plataformas digitais em 2020, mais especificamente, sob a perspectiva da mudança de paradigmas femininos com a influência do movimento feminista. Dessa forma, a pesquisa tem como objetivo estudar a obra originária e a personagem, descrever como esta é relida no cinema, além de pontuar os pontos de convergência, reforço e transgressão com a obra basilar. Para tanto, será utilizada pesquisa bibliográfica para investigar as indagações mencionadas no objetivo do trabalho. Propõe-se, portanto, contextualizar a sociedade de Jane Austen segundo os estudos de Alexandrova (2018), bem como as mudanças acarretadas pelo movimento feminista, como postulado por Machado (2018). Além disso, expor os estudos acerca da figuração e refiguração de personagens, segundo Reis (2016) e, por fim, realizar uma análise, unindo os tópicos estudados previamente. Dessa forma, será possível afirmar o caráter transgressor na obra de Austen, bem como afirmar a mesma característica em De Wilde. Palavras-chave: Jane Austen; feminismo; construção de personagem. ABSTRACT The present work seeks to investigate the changes between the character Emma from the homonym romance by Jane Austen and the adaptation with the same name released on digital platforms in 2020, more specifically under the perspective of the change in feminine paradigms with the influence of the feminist movement. Thereby, the research has the objective of studying the original work, the character, describe how she's reconstructed in cinema, in addition to punctuating the points of convergence, rupture and disruption with the basic work. Therefore, we will utilize a bibliographic research to investigate the questions mentioned in the objective of the work. Thus, proposes to contextualize Jane Austen’s society according to Alexandrova (2018), additionally to the changes entitled by the feminist movement, as postulated by Machado (2018). Furthermore, expose the studies concerning character figuration and refiguration, according to what Reis (2016) affirms and lastly, the analysis, uniting the topics studied previously. Hence, it will be possible to affirm the transgressor character in Austen’s work, as well as state the same characteristic in De Wilde’s work. Keywords: Jane Austen; feminism; character development. Lista de figuras Figura 1 – Emma com o vestido branco ………………………………………… 23 Figura 2 – Emma com o vestido branco ……………………………………….... 26 Figura 3 – vestido com detalhes verdes ………………………………………… 26 Figura 4 – olhar de Emma após fala de seu pai ………………………………... 29 Figura 5 – olhar de Emma após fala de seu pai ………………………………... 29 Figura 6 – briga após Harriet negar o pedido de casamento de Mr. Martin … 30 Figura 7 – olhar de Emma para Mr. Elton ……………………………………….. 31 Figura 8 – jovens no internato se reunindo para ver Emma ………………..… 32 Figura 9 – nariz de Emma sangrando após confissão de Mr. Knightley …….. 34 Figura 10 – Emma e Harriet se abraçam ……………………………………….... 34 Sumário 1. INTRODUÇÃO......................................................................................................... 9 2. A CONDIÇÃO FEMININA: DE JANE AUSTEN AO CONTEXTO DE AUTUMN DE WILDE........................................................................................................................ 11 2.1. Jane Austen e o contexto da época............................................................ 12 2.2. Feminismo e seus avanços..........................................................................14 2.3. A adaptação fílmica no campo feminista....................................................17 3. OS ESTUDOS DE FIGURAÇÃO E REFIGURAÇÃO DA PERSONAGEM...........19 3.1. A construção e reconstrução da personagem: Reis, Candido e Santos.20 3.2. Emma no processo de figuração e refiguração......................................... 24 4. ESTUDO COMPARATIVO ENTRE AS OBRAS....................................................27 4.1. Casamento segundo Emma......................................................................... 28 4.2. A equidade em Emma................................................................................... 30 4.3. Emma e Harriet.............................................................................................. 33 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................35 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................37 9 1. INTRODUÇÃO Jane Austen foi uma escritora inglesa que nasceu em 16 de dezembro de 1775 e morreu no dia 18 de julho de 1817. Entre essas duas datas, porém, Austen escreveu diversas histórias que seguem importantes até os dias atuais. “É uma verdade universalmente conhecida que um homem solteiro, possuidor de uma boa fortuna, deve estar necessitado de uma esposa” (AUSTEN, 1813), assim inicia o romance mais famoso da autora, Orgulho e Preconceito (1813). Ainda em vida, Austen recebeu prestígio por seus livros, recebendo até mesmo um pedido do príncipe regente para que ela dedicasse sua próxima obra a ele. Dessa forma, sua próxima obra inicia com os seguintes dizeres: “Para a Sua Alteza Real o Príncipe Regente, esse trabalho é, com a permissão de Sua Alteza Real, respeitosamente dedicado, por sua mais atenciosa, obediente e humilde serva, A Autora.” (AUSTEN, 2022, p. s/p) Esse livro se intitulou Emma, o qual estudaremos no presente trabalho. Essa obra conta a história da jovem Emma Woodhouse, uma moça rica, que perdeu a mãe muito cedo, sendo criada por seu pai e sua governanta, Miss Taylor. Apesar de ter uma irmã mais nova já casada, ela não planeja ter o mesmo destino, ao invés disso, decide que seu verdadeiro chamado é ser casamenteira, ou seja, ser adjutora na formação de casais. Com essa missão em mente, Emma começa sua jornada procurando um bom pretendente para Harriet Smith, uma jovem de origem humilde. Essa obra é sua penúltima publicada em vida, uma vez que faleceu dois anos depois do lançamento dela. Austen chegou a escrever o livro Persuasão e iniciou a escrita de Sandditon, mas faleceu em decorrência do que os médicos atualmente conhecem por “doença de Addison” antes que pudesse terminá-la. Mais de um século depois, Emma teve diversas adaptações, como webséries: Emma Approved (2014); filmes: Aisha (Índia, 2010); a série homônima do canal BBC (2009); e até mesmo o sucesso de bilheteria Patricinhas de Beverly Hills (EUA, 1995). Mais recentemente, houve o lançamento do filme homônimo lançado em 2020, com direção de Autumn de Wilde (EUA), do qual construiremos um paralelo. Formando este paralelo, será possível entender aspectos da refiguração da personagem Emma, além de entender se a obra difere da originária e os motivos que influenciam essa mudança, como as próprias alterações sofridas pelos paradigmas femininos acarretados pelas ondas feministas, por exemplo. 10 Para tanto, deve ser realizada uma pesquisa bibliográfica com intuito de encontrar respostas para o motivo das alterações feitas na adaptação, além de ressaltar os pontos de diferenciação entre a obra original e o longa-metragem. Dessa forma, esse trabalho encontra suas possíveis conclusões e análises nos trabalhos de Machado (2018), Reis (2016), Offen (1988), entre outros. 11 2. A CONDIÇÃO FEMININA: DE JANE AUSTEN AO CONTEXTO DE AUTUMN DE WILDE Carlos Reis (2015) afirma que elementos psicológicos, sociais e culturais são o que ajudam a personagem a sair da ficção e alcançar o leitor. Ou seja, tais elementos ajudam a reconhecê-la dentro do próprio mundo do leitor. Dessa forma, é imprescindível falar de livros e adaptações, incluindo o contexto histórico em que as obras em questão se inserem. É importante compreender a sociedade georgiana em que Jane Austen está inserida, em todos os seus aspectos, sejam eles financeiros, políticos, históricos, até mesmo de costumes, para que possamos compreender a obra original por ela produzida, assim como a sua adaptação cinematográfica. Simultaneamente, é importante compreender a era pós-moderna em que a adaptação fílmica é feita, para que compreendamos como a figura de Emma Woodhouse é figurada em cada época de produção da obra. Portanto, cada mudança feita pela adaptação é justificada pelo momento histórico e os valores associados a ele. Outro aspecto interessante de se atentar ao falar do contexto histórico em que as obras, e principalmente as personagens, se inserem, são as mudanças exercidas pelo feminismo. As mudanças iniciadas pelas sufragistas tratam de importantes avanços políticos nos direitos femininos, mas também afetam os valores da sociedade e o que consideramos como “morais” e “imorais”. Sendo assim, comparar a obra e a adaptação não envolve unicamente aspectos literários e cinematográficos, mas também político-sociais da sociedade georgiana e pós-moderna, que influenciam em toda a construção das obras, além da recepção que ambas recebem em seus campos. 12 2.1. Jane Austen e o contexto da época Jane Austen nasceu em uma época de prosperidade na Inglaterra. A era Georgiana perdurou aproximadamente de 1714 até 1830, sendo a única época testemunhada por Austen, que nasceu em 1775 e faleceu em 1817. Em 1701, na Inglaterra, foi aprovado o Act of Settlement, ou Decreto de Estabelecimento em português, que garantia a sucessão da coroa a outros protestantes. De acordo com esse decreto, a coroa passaria para a Princesa Sophia de Hanôver, mas ela acabou morrendo antes da monarca então reinante, Rainha Ana. Assim, em 1714, quando Ana morreu sem herdeiros, a sucessão recaiu nas mãos de Jorge de Hanôver, um protestante, que se tornou Jorge I da Grã-Bretanha. Esse evento marcou o início da sucessão de três reis chamados Jorge (seu filho e, posteriormente, neto), dando origem à chamada Era Georgiana. Apesar do período de desenvolvimentos urbanos, crescimento industrial, aumento do consumismo e de um maior acesso a artigos de luxo (bem como de um aumento da pobreza), especialmente em Londres, os monarcas não eram benquistos entre a população, posto que Jorge I e Jorge II eram considerados estrangeiros, pois eram nascidos em Hanôver, uma cidade alemã. Entretanto, Jorge III conseguiu maior popularidade pois nasceu na Inglaterra. Durante o governo da família sucessora dos polêmicos Tudor, a classe social acabou separando grandemente as pessoas. A hierarquia se organizava da seguinte forma: realeza acima de todos, nobreza acima do clero e clero acima da classe trabalhadora. Era assim que se formava a estrutura social britânica. Por esse motivo, Alexandrova (2018) diz que esse período foi de muita liberdade de movimento entre esses estratos, apesar de existir uma grande distância financeira, ou seja, os ricos eram muito ricos e os pobres eram muito pobres. O autor complementa dizendo ainda que a classe média era a força motriz da economia desse período. Podemos refletir também sobre a existência feminina nesse período, em que o feminismo ainda não era um movimento de impacto ou que já gerava resultados. Muito pelo contrário. Dessa forma, quando analisamos o comportamento ideal da mulher do século XVIII, encontramos uma mulher delicada, doce e doméstica (JONES, 2006). O papel da mulher era ainda de mãe, esposa e cuidadora, o 13 patriarcado a obrigava a cumprir esse papel. Segundo Pollock (1998), o pensamento era de que a mulher devia obediência ao marido —e, caso não fosse casada, ao pai. Além disso, a situação matrimonial da mulher do século XVIII era bastante rígida, o divórcio não era bem-visto e a mulher divorciada, apesar de ser permitido, acabava ficando à parte da sociedade, entrando em uma certa obscuridade. No caso do homem pedir divórcio, não seria um problema, apenas feriria os direitos de outro homem (THOMAS, 1995). Apesar dessas restrições, nesse período, já havia a permissão da mulher de trabalhar, caso a renda do marido não contemplasse os gastos da família e caso a família não possuísse terras para cultivar, elas eram permitidas de ir para fábricas e trabalhar. Entretanto, se o salário masculino já era baixo, o feminino era completamente inadequado (CLARK, 1982). Sendo assim, segundo Thomas (1995), as atitudes da mulher deste século eram todas baseadas nas vontades dos homens ao seu redor —marido ou pai— e não em sua própria vontade. Era valorizada sua castidade e obediência; estimulava-se a necessidade de ficar trabalhando no lar; naturalizava-se a prisão dentro de um casamento, que envolvia até mesmo agressões —físicas, verbais -. 14 2.2. Feminismo e seus avanços A primeira pessoa a se intitular como “feminista” foi a sufragista Hubertine Auclert, por volta de 1882 (OFFEN, 1988). Entretanto, em 1792, Mary Wollstonecraft escreveu o livro A Vindication of the Rights of Woman1, no qual propõe que a desigualdade entre os sexos era resultado da disparidade da educação recebida entre homens e mulheres. Assim, iniciou-se uma onda de pensamento que abarcou a causa dos direitos femininos, que, em sua maioria, os homens já haviam conquistado. Em 1903, Emmeline Pankhurst e outras mulheres fundaram a união Women's Social and Political Union2 (WSPU), dando origem ao movimento das Sufragistas, que lutavam pelo direito ao voto feminino. É válido ressaltar que o sufrágio feminino não era a única pauta dessa primeira onda feminista. Segundo o que argumenta Machado (2018), o movimento defendia que homens e mulheres mereciam igualdade de oportunidades, especialmente em questões morais e intelectuais. Entretanto, é importante notar que a luta feminista em sua fase inicial era restrita, abrangendo principalmente mulheres brancas das classes mais abastadas. À medida que os direitos de diversas minorias foram sendo conquistados em diversas partes do mundo, os estudos sobre o feminismo e as lutas por paridade de gênero continuam, a fim de contestar situações de desigualdade frente às diferenças de gênero. Nesse âmbito, Simone de Beauvoir publica seu livro O segundo sexo em 1949, no qual afirma: Os termos masculino e feminino são usados simetricamente apenas como uma questão de formalidade. Na realidade, a relação dos dois sexos não é bem como a de dois pólos elétricos, pois o homem representa tanto o positivo e o neutro, como é indicado pelo uso comum de homem para designar seres humanos em geral; enquanto que a mulher aparece somente como o negativo, definido por critérios de limitação, sem reciprocidade. … Está subentendido que o fato de ser um homem não é uma peculiaridade. Um homem está em seu direito sendo um homem, é a mulher que está errada. (BEAUVOIR, 1949, p. 9) 2 União Social e Política da Mulher 1 Uma Reivindicação pelos Direitos da Mulher 15 Destarte, em 1960, inicia-se a segunda onda feminista na Europa. No entanto, foi na década de 70 que as discussões mudam de foco, passando da opressão masculina para as questões de gênero. Essa chamada “segunda onda” se caracterizou pela diversificação das vozes feministas, abrangendo não apenas mulheres brancas e ricas, mas também as mais pobres, negras, entre outras. É possível inferir, porém, que essa fase causou o que é chamado de “whitewashing”, ou seja, o apagamento de pessoas negras de determinada parte da história (MANN; HUFFMAN, 2005). As lutas por paridade de gênero seguem avançando, e ao longo do tempo, as agendas feministas seguem mudando e se adaptando aos novos contextos sociais, políticos e econômicos. No início da década de 90 e no início do século XX, iniciaram-se o que alguns nomeaim como a terceira onda feminista. Não obstante, há estudiosos que argumentam que a terceira onda feminista surgiu, em termos cronológicos, durante a segunda onda, ao invés de posteriormente a ela (MANN e HUFFMAN, 2005). Além disso, há quem defenda a ideia de que as três ondas ocorreram de forma concomitante, incluindo a segunda, terceira e até uma quarta onda feminista (EVANS e CHAMBERLAIN, 2015). De todo modo, a década de 90 é considerada como o início da terceira onda feminista. Essa fase é caracterizada principalmente pela introdução de “novos paradigmas de comportamento femininos, tendo a ideia de empoderamento como pedra de toque fundamental” de acordo com Machado (2013, p. 3). Essa próxima fase engloba diversos momentos e pautas. Machado (2018) argumenta que essa nova onda é descrita por um influxo de feminismo liberal, mencionando autoras como Chimamanda Ngozi Adichie. A autora ainda afirma que esse tipo de feminismo se tornou “prejudicial” , à medida que algumas feministas acabam se debruçando sobre o chamado feminismo “girlie” para justificar seu consumismo desenfreado. Machado (2018) ainda afirma que essa onda é formada por jovens que não se aprofundaram sobre o feminismo que veio anteriormente, tornando-se um movimento que, muitas vezes, não considera os aspectos sociais. 16 Atualmente, no entanto, estamos vivenciando o surgimento da quarta onda feminista, que teve início em meados de 2012. Esse novo movimento, ao contrário de seu antecessor, não rejeita as ideias da segunda onda, que trata de questões como desigualdade sexual, exploração capitalista, sexismo e patriarcado; pelo contrário, retoma esses tópicos (CAMPBELL, 2015). Ademais, essa onda está bastante conectada à Internet, o que torna o feminismo mais diversificado, uma vez que as lutas acabam por chegar em uma maior quantidade de pessoas, resultando em uma espécie de “feminismo coletivo” (GARDINER, SHOCKNESS, ALMQUIST e FINN, 2019). A forte presença online das feministas também traz outras consequências. Por exemplo, os estudos sobre a quarta onda agora se encontram disponíveis em sites, disseminando ideias e reivindicações de forma muito mais rápida e tornando as suas características muito mais fluidas. Com rápida disseminação de informações e a mobilizações em massa, as feministas passam a se sentir preparadas para desafiar injustiças sistêmicas (GARDINER, SHOCKNESS, ALMQUIST e FINN, 2019). 17 2.3. A adaptação fílmica no campo feminista O filme Emma foi lançado no ano de 2020, tendo sido gravado pouco tempo antes da Organização Mundial de Saúde (OMS) alertar que o novo vírus, SARS-CoV-2, seria uma Emergência de Saúde Pública de Âmbito Internacional (PHEIC) e, posteriormente, uma pandemia. Por isso, o filme foi lançado direto em plataformas digitais, não passando por telas de cinema. Esse conceito de lançamento de filmes Blockbuster —ou seja, filmes de sucesso financeiro— sem passar por cinemas é muito recente, provando o quão contemporâneo o longa-metragem realmente é. Assim, podemos inserir o filme, em termos de feminismo, na quarta onda. É argumentado que essa nova onda surgiu da revolta contra o caso brutal de violência sexual que ocorreu com uma jovem na Índia. Esse caso ocorreu em dezembro de 2012 e causou revolta global3. Com essa questão latente se juntando com a própria inclinação das feministas contemporâneas de se fazerem presentes no mundo online, diversas manifestações começaram a acontecer em redes sociais, como o movimento #MeToo4, em que diversas mulheres começam a compartilhar sua experiência de violência sexual, com o propósito de demonstrar a magnitude do problema e do quão comum é a situação. A diretora do filme, Autumn de Wilde não ficou de fora dessa história. A própria afirma em uma entrevista que: “I think that for Jane Austen’s time, even writing a character like Emma was very feminist”5. Como se observa, a diretora não sentiu a necessidade de modernizar a personagem e a obra pois, como afirmou na mesma entrevista, a obra de Jane Austen é atemporal. Mesmo com essa afirmação da diretora, é impossível fugir de suas próprias crenças e do ambiente em que foi inserida. De Wilde conta em outra entrevista o seguinte: “I was born in Woodstock, in a log cabin in the woods, but I was raised in 5 "Eu acho que, para o tempo da Jane Austen, até escrever uma personagem como Emma era muito feminista" 4 Eu também 3 Em 2012, uma jovem estudante de 23 anos, Jyoti Singh Pandey, voltava à noite do cinema com o namorado. Quando entraram no ônibus, foram atacados por 6 homens, incluindo o motorista. Os criminais bateram no namorado que não pôde ajudar a jovem e cometeram violências físicas e sexuais com a menina. Singh sofreu ferimentos brutais, ficou internada por 13 dias, mas faleceu por falência múltipla dos órgãos. 18 L.A. But still, yes. My parents were hippies before there was a word for it”6, dessa maneira, a vivência que teve em seu meio não pode ser negada em seus trabalhos. Além disso, a autora afirma que, apesar de De Wilde não tentar "modernizar" Emma, mas sim "humanizá-la", a personagem tem defeitos, que não eram tão comuns em personagens femininas anteriormente, e que, apesar de ser uma adaptação que ela considera fiel, ainda tem liberdade criativa de mudar algumas partes da caracterização. Adicionando outra camada à questão do feminismo, Eleanor Catton, roteirista do filme afirma o seguinte sobre a personagem: “is exemplary because she makes mistakes and we all do, and I think a version of feminism which says, ‘Look at this faultless woman, you should be more like her,’ is kind of unhelpful”7, isto é, quando Austen escreve sobre essa personagem que ela julga que apenas ela gostará, as criadoras da adaptação veem isso como uma vantagem. Podemos concluir, portanto, que, apesar das criadoras manterem muitos aspectos fiéis ao livro, ainda sim se sentem livres para adaptar a personagem de acordo com suas ideologias, das quais não podemos nos desprender. Dessa forma, a personagem adaptada possui diferenças sutis quando comparada à obra original de Jane Austen. 7 “É um exemplo porque ela comete erros e todos nós cometemos, acredito que a versão do feminismo que diz ‘olhe para essa mulher impecável, você deveria ser mais como ela’, não ajuda tanto” 6 "Eu nasci em Woodstock, em uma cabine na floresta, mas eu cresci em Los Angeles. Mas sim. Meus pais eram hippies antes de ter uma palavra para isso." 19 3. OS ESTUDOS DE FIGURAÇÃO E REFIGURAÇÃO DA PERSONAGEM Quando Jane Austen escreve Emma, o ano era aproximadamente 1815. Anos depois, em 1895, os irmãos Lumière exibiram o primeiro curta cinematográfico. Como a autora faleceu em 1817, não pode presenciar a adaptação de seu livro para outros meios midiáticos, nem mesmo para o teatro, obviamente já existente na época de escrita do livro. Assim, é difícil visualizar que Austen imaginaria uma adaptação de seu livro e da personagem principal dele, ainda mais quando a própria autora não acreditava que grande parte do público iria gostar deles. Austen diz a seu sobrinho, James Edward Austen Leigh, “I’m going to take a heroine whom no one but myself will much like”8, conforme registrado em seu livro de memórias. Entretanto, o livro contraria suas expectativas e acaba se tornando um sucesso comercial e consagrando a personagem como uma das mais queridas criações de Jane Austen. Por outro lado, mesmo que Austen imagine ou não as adaptações que outras pessoas possam fazer de suas obras, é um fato que aconteceram adaptações não apenas das obras e personagens criados por essa autora, mas também de diversas obras da literatura e outros campos. Isso tem resultado em novos estudos acerca do tema da adaptação de obras, e de forma mais centrada, na adaptação de personagens. No presente trabalho, consideramos essa adaptação como um processo de “figuração” e “refiguração” de personagens, conforme postulado por (REIS, 2015). Como a pesquisa busca analisar comparativamente a obra original e a sua adaptação fílmica, é importante contextualizar, portanto, a respeito desses dois tópicos que caminham juntos. A figuração é o “fazer personagem”, ou seja, a construção original que o autor pensa e constrói em sua(s) obra(s), assim, a “refiguração” seria nada mais do que o “refazer” do personagem, sua adaptação, não necessariamente pelo mesmo autor que imaginou a obra original. Sendo assim, podemos contar com diversos autores que contam sobre o que é esse “fazer” e “refazer” de personagens, mas escolhemos aqui focar em três grandes intelectuais da área supramencionada e seus livros, sendo eles Antonio Candido (1963), Carlos Reis (2015) e Luis Alberto Brandão Santos (2001). 8 “Eu vou criar uma personagem que ninguém além de mim vai gostar” 20 3.1. A construção e reconstrução da personagem: Reis, Candido e Santos Ao longo da história da humanidade, verifica-se que a busca por se narrar histórias é uma prática muito antiga. A imaginação humana nunca foi condicionada apenas ao que é palpável e real. Assim, histórias vão sendo passadas de geração em geração, de modo que antigas lendas vão sendo modificadas e recontadas em diversos períodos históricos. Na verdade, cada história, sendo ela real ou não, conta com uma série de personagens, sendo elas humanas, animais ou até mesmo fenômenos meteorológicos, como no caso dos mitos gregos. A construção de personagens não é um tópico inexplorado na área da teoria da literatura. Como mencionado anteriormente, existem autores que trabalham com esse tópico. Assim, podemos iniciar a discussão da construção de personagens, relembrando o que diz Carlos Reis (2015), quando afirma que a figuração se define como “fazer personagem”, em suas palavras (REIS, 2015, p.121). A constituição de um personagem de ficção exige uma série de processos para sua criação. Reis complementa, afirmando que essa figuração não acaba em um momento específico do texto, mas sim ao longo do livro. Além disso, o autor reforça que esse processo não implica apenas na simples descrição da personagem. Relacionado com essa ideia, Santos diz que, quando narra, não é possível conhecer quem está lendo, mas, mesmo assim escreve para esse outro ser, essa "imagem", como o autor chama. Desta forma, apesar de Austen iniciar o livro com uma breve descrição de Emma, na visão em terceira pessoa, como a de quem descreve um colega a outro, Austen não sabia quem é esse “outro” (SANTOS, 2001). Emma Woodhouse, bonita, inteligente e rica, com uma casa confortável e disposição alegre, parecia reunir algumas das maiores bênçãos da existência; e vivera quase vinte e um anos no mundo com muito pouco a lhe causar angústia ou irritação (AUSTEN, 2022) Apesar de as palavras descritas na citação abrirem o livro e serem o primeiro contato do leitor com o livro e com a personagem, Austen não limita Emma a somente essas características ao longo da história. No início do romance, Emma é uma menina ingênua e quase sem nenhuma consciência sobre suas próprias ações e o impacto delas sobre os outros. Entretanto, não é assim que ela é finalizada no 21 romance. Como escreveu Reis (2015), a figuração acontece durante o percurso de todo o livro com as ações das personagens e as repercussões delas na trama. Reis ainda afirma que essas “ações confrontacionais” são ações comportamentais que acabam por auxiliar a figuração da personagem, apesar de não configurar por completo a personagem. Ademais, como diz Antonio Candido (1963), temos uma visão fragmentária de outros seres no mundo físico. Ou seja, juntamos cada fragmento do ser e buscamos entendê-lo. Contrariamente, em um romance, a personagem é escrita sendo delimitada e encerrada dentro de uma estrutura estabelecida pelo escritor. Com isso, o escritor marca traços de identificação entre personagem e leitor, sem tirar dele a impressão de complexidade que a personagem transmite. Podemos afirmar que Jane Austen constrói a personagem que dá origem a outras diversas adaptações. Como já relatamos inicialmente neste trabalho, a personagem aparece tanto em webséries, séries e filmes, como a adaptação de mesmo nome do canal britânico BBC, a websérie Emma Approved, ou até mesmo o sucesso comercial de 1995, Patricinhas de Beverly Hills. A última adaptação do livro, entretanto, é o filme Emma do estúdio Universal Pictures, lançado no ano de 2020, estrelado por Anya Taylor-Joy e com direção de Autumn De Wilde. Não é possível descrever o que Austen, já muito próxima de sua morte, terá imaginado quando escreveu o Emma. É o estudo do texto, das personagens, que trará à tona uma possível interpretação da complexidade assinalada na criação do romance. Assim, não é possível conseguir a opinião da autora ao reescrever sua personagem para outros meios, que não o papel. Entretanto, De Wilde e a roteirista Eleanor Catton decidem recontar a história de 1815. Essa adaptação é chamada por Reis (2015) de refiguração ou transfiguração e assim chamaremos no presente trabalho. A refiguração é descrita por Reis (2015) como o processamento de um texto —seja ele uma fotografia, pintura, texto oral, escrito, entre outros— em outra linguagem. No caso, aqui temos uma personagem de livro sendo transfigurada em uma personagem de uma obra cinematográfica. Mesmo com certa desconfiança de autores com a refiguração de seus personagens, essa sobrevida (aqui considerando que a obra possui uma “vida” e sofre alterações à medida que é expressada por diversos meios de comunicação) de personagens pode levar a diversos desdobramentos como novas leituras que fogem completamente do que o autor original escreveu, mas também pode levar a leituras 22 em contextos históricos e sociais que o autor não conheceu, podem levar a personagem a ir além do que já foi criado (2015). Na obra de 2020, podemos apontar aspectos que são tão à frente de Austen, que é possível que a própria não imaginasse sua personagem em tais situações, como, por exemplo, a cena em que Emma está se trocando com a ajuda de uma empregada da família e, quando ela sai, levanta seu vestido na frente da lareira de seu quarto. Considerando a modéstia prezada pela sociedade georgiana, na Inglaterra, como diz o termo popular francês da época, “le bon ton”, ou “o bom gosto”, ou “às boas maneiras”. Por outro lado, podemos citar que Paulo Emilio Sales Gomes (1963) afirma que o fato da personagem, quando adaptada do romance ao cinema, toma sua forma em uma atriz (aqui, Anya Taylor-Joy) e perde um pouco de sua habilidade de se comunicar diretamente com o leitor. O narrador consegue escrever seus pensamentos diretamente no livro, mas isso precisa ser demonstrado por diversos outros artifícios no filme, um exemplo é quando Emma faz uma piada ofensiva para Miss Bates e se arrepende após Mr. Knightley pontuar suas ações. O narrador diz: Nunca, em nenhuma circunstância de sua vida, se sentira tão agitada, mortificada e triste. Estava muito impressionada. Não havia como negar a verdade do que ele havia dito. Sentiu isso dentro do coração. Como pudera ser tão brutal, tão cruel com Miss Bates? Como pudera expor-se a uma opinião tão cruel de alguém a quem estimava tanto? E como pudera permitir que ele a deixasse sem dizer-lhe uma palavra de gratidão, de concordância, ou de simples bondade? (AUSTEN, 2022) Contudo, pode haver numa adaptação uma maior liberdade na questão psicológica da personagem, por exemplo, as expressões da atriz frente a acontecimentos, como na cena inicial do livro, em que o narrador descreve brevemente algumas características da personagem. Esse parágrafo de descrição dos acontecimentos da vida dela que a tornaram quem ela é, acaba se tornando os primeiros minutos do filme, em que Emma escolhe as suas flores para o buquê e dá ordens aos criados, expandindo a maneira em que Emma inicialmente se porta. Figura 1 – Emma com o vestido branco 23 Fonte: Emma, 2020 Sendo assim, as personagens escapam de sua realidade e adquirem uma dimensão transhistórica, e fugindo do controle do autor (GOMES, 2015). Tal compreensão pode nos ajudar a entender a escolha de De Wilde ao alterar algumas cenas da personagem Emma. 24 3.2. Emma no processo de figuração e refiguração Anteriormente, examinamos a fundamentação bibliográfica utilizada na seção que diz respeito aos estudos literários. Desse modo, é possível compreender as perspectivas de Reis e Gomes acerca da figuração de personagens e, por conseguinte, aplicar tais perspectivas aos objetos escolhidos para análise, permitindo assim, uma compreensão mais abrangente da figuração da personagem por completo. Na abertura do livro, por exemplo, podemos perceber a figura da personagem sendo construída de forma que se torna difícil simpatizar com suas opiniões e atitudes. O livro assim a descreve: Os verdadeiros percalços da situação de Emma estavam, no entrando, em seu empenho talvez excessivo de seguir seus próprios caminhos e na disposição de pensar em pouco bem demais em si mesma (AUSTEN, 2022) Em outras palavras, a personagem é explicitamente egoísta. Esse comportamento guia as suas ações no livro. Este mesmo comportamento é refletido no início do filme. Todavia, a adaptação parece dar destaque a evolução da personagem, por exemplo, quando Emma faz uma piada que ofende Miss Bates, sua reação —no livro— foi de arrependimento apenas depois de Mr Knightley mencionar o desconforto da senhora, dizendo Posso lhe afirmar que ela entendeu. Compreendeu exatamente o que você quis dizer, e desde então só fala disso. Gostaria que tivesse ouvido como ela falou a respeito... com tanta candura e generosidade. Gostaria que tivesse ouvido como era agradecida pela sua paciência em conceder a ela tantas atenções, como aquelas que ela sempre recebeu de você e de seu pai, quando a companhia dela é tão aborrecida. (AUSTEN, 2022) Em contrapartida, no filme, podemos perceber um sentimento de remorso imediatamente após essa fala infeliz. Dessa forma, Emma não se sente feliz pelo bom casamento de Miss Taylor (que agora se torna Mrs. Weston), mas se sente triste pela falta que a governanta fará em seu cotidiano e as coisas a qual era útil, fato mencionado novamente quando se refere a Harriet. Segundo os dizeres do 25 narrador, "Emma percebeu desde cedo o quanto ela lhe poderia ser útil" (AUSTEN, 2022). Além disso, a garota possui outro traço marcante relacionado à sua personalidade que a autora acreditava ser exclusiva dela, que é a manipulação. Emma, impulsionada por sua vontade egoísta de atuar como casamenteira, acaba interferindo na vida de sua amiga Harriet. Verifica-se isso quando a personagem decide com quem a amiga deve se casar. Emma elege Mr. Elton como candidato ideal e acaba coagindo-a a negar o pedido de casamento de Mr. Martin, um jovem apaixonado por Harriet, mas com condições financeiras inferiores. Por outro lado, o filme parece tentar esconder a manipulação de Emma, fazendo com que a personagem não diga explicitamente que deseja a recusa de Harriet para o pedido de casamento de Mr. Martin. – Acha então que devo recusá-lo? – disse Harriet, de cabeça baixa. – Se deve recusá-lo! Minha querida Harriet, o que quer dizer? Tem alguma dúvida disso? Eu pensei... Mas peço desculpas, eu devo ter-me enganado. Com certeza me enganei, se você tem dúvida quanto ao sentido da sua resposta, achei que estivesse me consultando apenas quanto ao que devia escrever. (AUSTEN, 2022) Nesse contexto, na adaptação cinematográfica, podemos perceber claramente um distanciamento em relação à obra original. A personagem diz apenas que Harriet deve fazer sua própria escolha, enquanto vira de costas para a menina, mostrando ao público a barreira que constrói entre as duas personagens, de modo que Emma não necessariamente escolhe por sua amiga, mas deixa com que Harriet perceba que sua amiga ficaria descontente, de acordo com o que já sabe de sua personalidade e gostos. Assim, o filme tira um pouco da culpa da personagem principal. Ademais, é possível teorizar que, para inocentar (ou, até mesmo, evidenciar suas emoções) da personagem, o filme também conta com a ajuda do figurino de Emma. Seus vestidos, nos momentos em que se mostra vulnerável ou até mesmo realmente inocente, blindada pela ignorância provida de sua condição financeira, são brancos, como por exemplo, quando pinta um quadro de Harriet para Mr. Elton, está usando branco, pois quando pinta, está vulnerável. 26 Figura 2 – Emma com o vestido branco Fonte: Emma, 2020 Outro exemplo da possível representação das emoções de Emma em seus vestidos é no momento que dança com Mr. Knightley. Nesse momento, observamos que a sua paixão pelo amigo a torna vulnerável, assim, o vestido branco a representa. Em contrapartida, no momento em que ofende Miss Bates, em um momento posterior, seu vestido branco ainda representa que se sente vulnerável, mas se sente assim pelo remorso que o sofrimento de Miss Bates a causou. Os vestidos também podem representar outras emoções, como no final do filme, quando Harriet diz que está apaixonada por Mr. Knightley e ela precisa negar o pedido de casamento do seu amado, em nome de sua amizade com Miss Smith. Ali, o vestido aparece branco, com traços verdes, possivelmente representando a inveja, o ciúme de saber que seu amado possivelmente não seria realmente seu. Figura 3 – vestido com detalhes verdes Fonte: Emma, 2020 27 4. ESTUDO COMPARATIVO ENTRE AS OBRAS Os tópicos anteriores introduziram conceitos importantes para a compreensão completa da obra original, como a figuração de Emma, o modo como a personagem é levada durante a trama e como ela se comporta perante algumas situações e outros personagens, por exemplo, na cena em que a jovem faz uma piada que ofende Mrs. Bates. No filme, podemos ver uma reação imediata de arrependimento da personagem, pela expressão da atriz, mas, no livro, Mr Knightley precisa ir até a menina e explicar que o que fez foi errado. – Emma, preciso falar com você mais uma vez de modo franco, como tenho feito. Sei que é um privilégio mais suportado do que permitido, talvez, mas ainda assim devo usá-lo. Não posso vê-la agindo errado, sem fazer-lhe uma advertência. Como pôde ser tão insensível com Miss Bates? Como pôde ser tão insolente usando sua sagacidade com uma mulher com o caráter, a idade e a situação dela? Emma, jamais pensei que isso fosse possível. (AUSTEN, 2022) Assim, com a reunião das informações supracitadas, é possível traçar um paralelo entre a figuração e a refiguração da querida personagem de Austen, uma vez que cada autor produz sua própria obra de acordo com suas próprias ideologias. Autumn de Wilde, diretora da adaptação afirma que, como dito anteriormente, tomou liberdades criativas com a criação de sua personagem, então, a criação de sua obra não foi uma cópia de Austen, uma vez que, segundo Linda Hutcheon (2011), aquele que adapta se posiciona perante a obra, assim, sua adaptação refletirá seu partido. À vista disso, podemos nos apoiar em alguns tópicos no presente trabalho para formular uma análise de alguns dos aspectos da personagem, a fim de reconhecer a grandeza do trabalho de Austen, mas também observar as mudanças que De Wilde e Catton incluíram em sua obra. Para além disso, o que possivelmente motivou tais mudanças. 28 4.1. Casamento segundo Emma Pudemos observar algumas características da figuração de Emma no livro original nos capítulos anteriores, entretanto, a adaptação também inclui certos traços que não necessariamente eram comuns entre mulheres da época. Vimos que a mulher do século XVIII tinha a expectativa de ser uma moça quieta, casta, que almejava casar e constituir família. A personagem de Austen já era um ponto fora da curva, uma vez que abertamente anunciava sua falta de vontade de casar, chegando a conversar com seu pai: – Bem, minha querida, gostaria que não fizesse mais casamentos nem prognósticos, pois tudo que você diz sempre acaba por acontecer. Por favor, não faça mais casamento algum. – Prometo não fazer nenhum para mim mesma, papai, mas devo fazer para os outros, de verdade. (AUSTEN, 2022) A crença da menina destacada no excerto acompanha a personagem durante o filme, onde a mesma frase é repetida durante o caminho até o casamento de Miss Taylor. Entretanto, é possível perceber, na expressão da menina, que ela não concorda quando seu pai sente pena de Miss Taylor, indicando uma possível falta de aversão ao casamento, retomando uma crítica feita ao pensamento feminista —a de que as feministas são contra o casamento e não pretendem casar-se. No livro, Emma chega a rebater seu pai e elogiar a relação, além do próprio Mr Weston, com quem Miss Taylor está se casando. Entretanto, essa fala tem apenas o propósito de acalmar seu pai, como informa o narrador do livro: Emma não poupou esforços para manter este feliz fluxo de ideias, e, com a ajuda do jogo de gamão, esperava manter o pai em tolerável disposição durante a noite, sem outros pesares além do seu. (AUSTEN, 2022) Por outro lado, a mudança de expressão da atriz Anya Taylor-Joy indica uma discordância com seu pai, mas de modo silencioso, um olhar expressivo de contemplação sobre os sentimentos de seu pai —quem Emma mais ama— sobre casamento. Figura 4 – olhar de Emma após fala de seu pai 29 Fonte: Emma, 2020 Figura 5 – olhar de Emma após fala de seu pai Fonte: Emma, 2020 Vale mencionar, entretanto, que Emma, no filme, ainda assim não almeja o casamento, dizendo, por vezes, que não pretende se casar, uma vez que o casamento seria mais interessante caso precisasse melhorar sua classe econômica e social, algo que a jovem claramente não precisa. Entretanto, nesse breve momento, podemos perceber que a jovem não é completamente contra essa ideia, contrariando as chamadas “antifeministas”. 30 4.2. A equidade em Emma Além da questão do casamento, é possível mencionar outra característica da jovem, sendo ela a determinação, marcada no livro principalmente pelas discussões que tem com Mr. Knightley, que, no livro, são mais amenas. A própria menina, mesmo que retruque as críticas de Mr. Knightley, acaba acatando o que diz. Na verdade, ela vê essas discussões menos como uma intriga, mas como apenas Mr. Knightley maldizendo a jovem, como diz ao seu pai, quando este pensa que a filha está criticando-o. – Meu querido papai! Não pode acreditar que eu estivesse me referindo ao senhor, ou imaginar que Mr. Knightley se referisse ao senhor. Que ideia horrível! Não! Eu me referia a mim mesma. Mr. Knightley adora encontrar defeitos em mim, o senhor sabe... De brincadeira. É tudo brincadeira. Sempre dizemos o que pensamos um ao outro. (AUSTEN, 2022) Todavia, podemos notar que, nos momentos em que o casal discute, os argumentos são mais frenéticos, com ambas as partes falando rápido e por cima um do outro. Além disso, é interessante notar o modo com que a câmera, instruída por De Wilde, segue o casal de modo em que ambos estão equipolentes na discussão. Aqui podemos citar como exemplo o momento em que Mr. Knightley confronta Emma pela influência dela na recusa do pedido de casamento de Mr. Martin. Figura 6 – briga após Harriet negar o pedido de casamento de Mr. Martin Fonte: Emma, 2020 Dessa forma, as duas partes ocupam o mesmo espaço na câmera, tanto no momento da imagem, quanto em outros momentos da discussão, em que os dois 31 não aparecem ao mesmo tempo. Ainda assim, ambos ocupam o mesmo espaço no plano e contraplano, demonstrando a relação de igualdade em que se encontram, portanto, a força da jovem, que consegue estar nessa posição com um homem no século XVIII. Emma também confronta Mr. Elton quando oferece levar a menina em sua carruagem até sua casa. O pastor então confessa que seu interesse é nela e não por Harriet, que suas visitas são pois Miss Woodhouse o encorajou a acreditar que sente o mesmo interesse por Mr. Elton. Emma nega e, novamente, a câmera apresenta os dois ocupando o mesmo espaço físico na câmera. Figura 7 – olhar de Emma para Mr. Elton Fonte: Emma, 2020 As expressões da atriz contribuem para transmitir ao espectador a firmeza da menina perante presenças masculinas. Anya Taylor-Joy é amplamente conhecida por sua participação em filmes de terror como A Bruxa (2015), Fragmentado (2016), O segredo de Marrowbone (2017), entre outros, assim, é possível que a escolha da atriz também seja por sua filmografia, uma vez que a audiência reconhece esse caráter de resistência na personagem presente. Ademais, podemos estender o poder que a jovem exerce a outras personagens femininas, como quando a jovem vai visitar Harriet Smith quando essa ficou doente. Emma chega no internato e murmúrios começam, risadas de animação, até mesmo meninas correndo para acompanhar a chegada de Emma e ouvir atentamente ao que Miss Woodhouse vai anunciar. Figura 8 – jovens do internato se reunindo para ver Emma 32 Fonte: Emma, 2020 33 4.3. Emma e Harriet A quarta onda feminista conta também com um conceito novo, a sororidade, termo advindo do latim soror, irmã. Sendo assim, o termo indica a união entre mulheres, o fim da rivalidade feminina, uma vez que acreditam que essa rivalidade é interessante para a manutenção do homem no poder. Dessa forma, Autumn de Wilde inclui em seu longa metragem uma mudança na relação entre Emma e Harriet para se encaixar nesse novo molde de relações femininas. De Wilde, em entrevista, afirma que queria tratar Emma como uma história de amor dupla, ou seja, sua relação com Mr. Knightley teria o mesmo peso, a mesma importância de sua relação com Harriet Smith. A roteirista Eleanor Catton complementa a informação, “Female friendship is a very contemporary subject, and it hasn’t been given a lot of airtime in a serious way on film”9. Assim, intencionalmente a relação entre as partes muda, por exemplo, quando Mr. Knightley confessa seus sentimentos por Emma, o primeiro pensamento da jovem não é de proibição pois sua amiga também o ama, mas sim de felicidade por ter sido a escolhida, por Harriet não representar o mesmo que ela na visão do amado. Foi capaz de ver que as esperanças de Harriet eram inteiramente infundadas, um erro, uma ilusão, uma completa ilusão como qualquer uma das suas... Que Harriet não representava nada, e que ela era tudo! (AUSTEN, 2022) Por outro lado, quando o amado termina de falar, o nariz de Emma sangra, possivelmente indicando uma quebra dessa ilusão, uma vez que sua amiga amava o mesmo homem, então não poderia efetivamente ficar com o amado. A abdicação do objeto de desejo por quem Emma nutre sentimentos há anos, mesmo que seja em seu subconsciente, demonstra o quão forte é o laço entre as meninas e o quanto Emma estaria disposta a se sacrificar em nome da amizade das duas e a felicidade da amiga. Dessa forma, mais uma vez, de Wilde comprova sua tentativa de equiparar o amor do romance e o amor entre as mulheres. Figura 9 – nariz de Emma sangrando após confissão de Mr Knightley 9 “Amizade feminina é um conceito muito contemporâneo e não tem recebido muito tempo no ar de forma séria em filmes.” 34 Fonte: Emma, 2020 Além disso, a menina ainda foi até a casa de Mr. Martin para que ele refizesse seu pedido de casamento a Harriet. Dessa forma, ao contrário do livro, em que Harriet consegue um final feliz puramente acidental, Emma demonstra sua amizade ao tentar consertar o que danificou em suas tentativas de casar a amiga. O filme também adiciona cenas em que as jovens demonstram cuidado e carinho genuíno com a outra parte, como a cena em que as jovens ensaiam a dança para o baile do dia seguinte. Olhares de carinho e proteção por parte da principal também diferem a personagem do livro e adicionam mais uma camada entre a relação das jovens. Figura 10 – Emma e Harriet se abraçam Fonte: Emma, 2020 35 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho teve por propósito analisar os elementos adaptados no filme Emma (2020), quando comparado ao livro originário homônimo, por meio de uma pesquisa de revisão bibliográfica e estudo de caso. Assim, o trabalho buscou encontrar os motivos que incentivaram as mudanças adotadas na adaptação. Após contextualização, levantamento de dados e análise de ambas as obras, do livro de Austen e da adaptação, podemos inferir que as hipóteses iniciais, baseadas na ideia de que o movimento feminista influenciaria a adaptação, são corretas, como procurou-se demonstrar no corpus deste trabalho. Além disso, pudemos diferenciar o contexto histórico em que as criadoras e a audiência viveram, a fim de compreender a necessidade de mudanças que De Wilde sentiu ao revisitar a obra de Austen. Na adaptação, a criadora pôde trocar ou manter alguns detalhes, como por exemplo a relação entre Emma e Harriet, que é citada por de Wilde como uma relação de amor, mas também mantém características da jovem como a vontade de não casar. Assim, o trabalho cumpre seus objetivos iniciais de analisar a obra e personagem no contexto das devidas criadoras —Austen e De Wilde—, além de descrever os possíveis motivos para tais mudanças, apresentando outra visão sobre a personagem em ambas as versões e aprofundando os estudos sobre ambas. Outro tópico abordado no trabalho foi a construção de personagens. Com um capítulo dedicado a essa questão, pudemos também compreender sobre os conceitos de figuração, ou "fazer personagem", como descreve Reis (2015). Como se constrói a personagem no livro original, mas também como se refigura a personagem no filme. Por fim, pudemos analisar as alterações realizadas por De Wilde e Catton em uma perspectiva da quarta onda feminista, comparando com a obra de Jane Austen, pontuando aspectos da obra originária que são progressistas quando inserida em no contexto da autora, mas também aspectos que estão de acordo com seu período, como a questão da amizade de Emma e Harriet, pontuada no último capítulo. De todo modo, as análises empreendidas nos levaram ao entendimento de quanto Austen esteve à frente de seu tempo, imprimindo um caráter transgressor à Emma, principalmente por ressaltar o caráter altivo e contestador da protagonista que resistia em se casar (mesmo que ceda no final da história); e o caráter progressista de De Wilde, por evidenciar esse caráter feminista em meio a um 36 período (já no âmbito atual) em que certos estigmas femininos continuam a se impor em meio às lutas históricas por paridade e protagonismo das mulheres. 37 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AUSTEN, Jane. Emma. 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